Pensar Futebol
Em tempos li textos sobre a origem do futebol. E quando digo futebol refiro-me ao que conhecemos, e não aquele que nos tentam impingir, supostamente criado pelos chineses e, segundo alguns, até pelos incas! Sejamos sérios: o futebol como desporto moderno foi criado nas ilhas britânicas em meados do século XIX. E, como convém, foram criadas regras para cumprir durante um jogo de futebol. Presumo que essas regras e leis não tenham surgido nos primórdios do jogo mas posteriormente, à medida que o mesmo se foi popularizando. E essas leis, quais mandamentos, foram consideradas sagradas e inatacáveis. Passaram-se décadas, um século, inclusivé dobrou-se um milénio! Para ser justo é bom que se diga que a permissão para substituições surgiram já em meados da década de 70, bem como a regra de fora de jogo, entre outras coisas menores. Mas quando observo o nível evolutivo de muitas outras modalidades, quando assisto ao nível de profissionalismo e modernismo das competições geridas pelos norte-americanos, da qual a NBA é a jóia da coroa, não posso deixar de me intrigar do porquê do sedentarismo parolo dos todo-poderosos que mandam no futebol.
Para começar não entendo porque se alimenta a ideia de que o futebol tem de se orientar pelo que se faz no mais recôndito e miserável cantinho do planeta. Lá porque no Sudão, para dar exemplo, não tenham meios tecnológicos para avaliar situações de jogo… implica que na Champions League os mesmos não possam ser utilizados? E este exemplo serve sobretudo para alcançar a verdadeira discussão: porque não meios tecnológicos a auxiliar os árbitros nas primeiras ligas de cada País, esquecendo-os nas restantes divisões, pela falta de capacidade de financiamento e sustentabilidade dos mesmos? Que interessa o que se passa nessas divisões, verdadeiramente? Lá porque o S.João de Vêr não tem capacidade de adquitir tais meios tecnológicos implica que as equipas a sério não possam ter à sua disponibilidade tais meios? É ridículo!
Um exemplo para sustentar tal tese. Os “lobos”, a equipa nacional de rugby, foi ao Mundial e, quando jogou frente ao neozelandeses, efectuou um ensaio que só foi confirmado através de imagens televisivas. Por acaso as equipas de rugby nacional têm esses meios? Nem sequer têm os jogos transmitidos na televisão, quanto mais repetições! Mais um exemplo? O sistema “eagle eye” do ténis, só utilizado nos grandes torneios de ténis para auxiliar os jogadores que, na dúvida da decisão do árbitro ou fiscais de linha, pedem o auxílio da máquina. Pois o nosso Frederico Gil só neste último torneio que se encontra a disputar na África do Sul é que contactou com o dito sistema, que já se encontra activo há 2 anos!
Ou seja, os nossos atletas, que em Portugal não têm condições de contactar com as inovações tecnológicas, beneficiam das mesmas quando a situação o permite. Tão simples quanto isto. O Varzim não teria meios tecnológicos ao seu dispôr na Segunda Liga mas, subindo de divisão, teria o auxílio da milionária FIFA para instalar os meios necessários. Tão simples quanto isto. Bolas dentro da baliza, agressões, penalties/ simulação de penalties, tudo a ser decidido pelo árbitro com o auxílio das novas tecnologias. Inclusivé a regra do ténis podia ser adaptada ao futebol, ou seja, de forma ao jogo não ser interrompido constantemente apenas e só com o objectivo de quebrar o ritmo do mesmo, as equipas só tinham ao seu dispôr, por cada meia parte, duas interrupções para confirmar decisões arbitrais. Tudo, mas mesmo tudo, é melhor que a pouca vergonha actual.
Mas existem outras leis que devem ser repensadas. Por exemplo, a do fora de jogo. É incrível como muitas das vezes 20 jogadores encontram-se amontoados numa faixa 30/40 metros, quando o campo tem para cima de 100 metros de comprimento! Não digo abolir a lei, de forma alguma. Mas é criminoso assinalar fora de jogo quando um jogador se encontra a meio campo, a cerca de 60 metros da baliza! Isto é abominável! Basta um marcador e cal, nada mais do que isso, para criar 2 novas linhas horizontais, paralelas às linhas de fundo, a meia distancia entre as grandes áreas e a linha de meio campo. Assim, no máximo, um jogador estaria em fora de jogo a 30 metros da baliza. E, assim sendo, a disposição dos jogadores em campo já não seria na clássica faixa de 30/40 metros mas sim numa de 55/75 metros, aumentado deste modo a jogabilidade e a criação de espaços. E as dimensões das balizas? Caramba, inalteráveis desde o tempo em que os guarda-redes não sujavam os calções e usavam gravata! Tenham dó, nunca menos de 1 metro mais de largura e ½ metro de altura. E estou a ser conservador!
Quanto aos 90 minutos, divididos em duas metades de 45 minutos cada. Errado, sem hesitações de qualquer espécie. As estatísticas não enganam, raramente a bola está em jogo mais do que 60 minutos. Então, se assim é, porque não adoptar a política de outras modalidades, de cronometrar e parar o tempo de jogo, contabilizando apenas o real tempo em que a bola está em jogo? Porque não duas metades de 30 minutos (exemplo1) cronometradas? Ou três metades de 25 minutos, com intervalo de 5 minutos entre cada parte (exemplo2) cronometradas? Um jogo poderia, deste modo, ter tanto 80 minutos no exemplo1 ou 120 minutos, consoante o nível de paragens do mesmo. Enquanto que, hoje em dia, os espectadores entram num estádio às 19.45h sabendo, de antemão, que às 21.30h estão de saída, com estas mudanças poderão sair tanto às 21h, como às 21.30h ou mesmo 22h! Basta consultar o site da NBA e observar as fichas dos jogos, o tempo de jogo varia sempre entre as 2h e 2.30h, quando na realidade são quatro períodos de 12 minutos cada, ou seja, 48 minutos de jogo para um total mínimo de 120 minutos no pavilhão! Ou menos que se reflicta sobre o assunto, que se façam estudos sobre o que querem os adeptos, afinal sem eles não existira futebol de alta competição.
E quanto a mudanças nas regras e leis de jogo já seria um começo para aumentar a espectacularidade do jogo. É que, ao contrário do que pensam e desejam os Josés Mourinhos, o futebol não consiste em não sofrer golos e ganhar por 1-0! Se assim fosse, se a regra fosse essa, não teria metade dos milhões de adeptos espalhados pelo Mundo! Queremos golos, o oxigénio do futebol, e se é necessário fazer alterações nas leis seculares, que não se hesite um segundo.
Outra medida tida como essencial e que tem sido cavalo de batalha de Michel Platini, presidente da UEFA, é o equilíbrio de forças entre clubes milionários e clubes remediados. Não é bom para o futebol o surgimento de mecenas árabes, habituados a querer, poder, mandar e fazer. O desporto não pode ser o recreio de meia dúzia de figurões que se apoderam dos melhores jogadores e fazem torneios entre si. O que fez Abramovich, inflaccionando sobremaneira os passes e salários dos jogadores já foi perigoso quanto baste, a entrada dos sauditas e qataris nesta brincadeira, dispostos a pagar para cima de 150 milhões de euros por cada “craque do momento” atingirá fatalmente o jogo. Mais uma vez há que olhar com atenção para a noção de jogo dos americanos, para o seu sentido de distribuição de riqueza, qualidade e quantidade. Uma equipa até pode perder a cabeça e contratar o Messi, mas já sabe que grande parte do seu orçamento para construir o plantel terá sido desbaratada. Quem não tem seguido a novela LeBron James, jogador que ficará livre em 2010 e que só poderá sair (se quiser!) para uma equipa que disponha ainda de orçamento para o contratar sem ultrapassar o tecto salarial imposto pela direcção da NBA. Por alguma razão os NY Knicks já começaram a despachar os seus atletas mais caros para abrir alas ao King James!
E já que falamos em regras para manter a concorrência de forma justa, séria e honesta, bato palmas à iniciativa de Michel Platini em pretender planteis de 25 jogadores no máximo e apenas uma época de transferências por cada ano, impedindo deste modo que jogadores joguem a mesma competição por mais do que uma equipa. Tem razão o francês mas esquece-se de algo que, pelo menos em Portugal, roça o escândalo e o ridículo: a quantidade de jogadores emprestados a jogar na mesma divisão do clube emprestador! Ou sou eu que sou paranóico ou, provavelmente, isto é tudo menos compatível com a seriedade e honestidade que se deseja de uma competição. A meditar, não pelos dirigentes portugueses que são, na sua na generalidade, 90% corruptos e idiotas, mas sim pelos estrangeiros que sempre têm um pouco de bom senso que tanta falta faz por cá.
Este é o rumo que o futebol terá de tomar. Não é por acaso que cada vez mais jovens mostram menos interesse por ele; desportos tidos como radicais e com capacidade de gerar emoções fortes tomam o espaço outrora sem rival do futebol que, ainda assim, sobrevive pela paixão clubística, paixão essa cada vez mais conectada pelo amor ao clube e não ao jogo. E, quando assim é, algo de errado se passa. Mudanças exigem-se, não é suportável a ideia de que o futuro do jogo se encontre entregue às mãos de juízes que, semanalmente, se contradizem nos seus métodos de avaliação, ao sabor dos seus interesses e dos interesses dos que lhes pagam. Exemplos: Um jogador no limite de fora de jogo tem prioridade em seguir a jogada, segundo diz a lei, que beneficia quem ataca… no entanto a mesma lei é aplicada de forma arbitrária, já para não dizer consoante a cor da camisola. Faltas para admoestação são para serem consideradas aos 2 minutos tal como aos 66 minutos. Lances em cima da linha de baliza têm de ser avaliados sempre da mesma forma, a lei favorece quem ataca, então que se assinale golo em toda a qualquer situação duvidosa, não olhando a camisolas nem interesses ocultos. A falta de critérios nas arbitragens, que aplicam a lei de uma forma tão matreira que incomoda quem tenta levar o jogo como um entretenimento, um entretenimento sério, porque se fosse uma brincadeira seguramente não haveriam tantos milhões apaixonados (até quando?) pelo melhor espectáculo do Mundo!
Fica a questão: Há vontade em colocar o futebol no século XXI?